— Ele está desfigurado — gaguejou o jovem que embalava suas compras.
— Se nunca o viu, como pode saber disso?
O garoto deu de ombros, como se fosse de conhecimento geral. Embora ninguém tivesse visto Cullen.
— Não acho que a aparência seja importante — respondeu ela, tentando controlar-se, e detestando que as pessoas dessem tanta importância às aparências. Ela sabia, por experiência própria, como isso era injusto e preconceituoso, embora por motivos opostos. As mulheres recusavam-se a ser suas amigas, acreditando que se imaginava melhor do que elas. Os homens quase pisoteavam uns nos outros para aproximar-se, todos tentando levá-la para a cama, ou convidá-la para um acontecimento social, onde pudessem exibi-la como um troféu. Ninguém, nem mesmo o ex-noivo, conseguira ver além do rosto lindo que Deus lhe dera. E, aparentemente, ninguém queria ver além das cicatrizes de Cullen.
Tudo isso fazia Bella sentir um estranho impulso de defender um homem que nem conhecia. Era difícil manter o controle diante de tantos preconceitos.
— Coloque na conta dele, e mande entregar por volta das três — pediu, saindo depressa e sentindo que todos os olhares a acompanhavam.
Em vez de pegar um táxi para casa, resolveu acalmar-se, caminhando pela pitoresca cidadezinha. Mas as lembranças continuavam a atormentá-la. A mãe, arrastando-a para comerciais de tevê, desde bem pequena, os concursos, tudo que sempre detestara. E quando crescera, escolhia participar apenas dos que lhe interessavam, porque queria ir para a faculdade, e precisava do dinheiro.Olhando em volta, viu as vitrines das pequenas lojas, os bancos de madeira espalhados por vários locais, turistas e moradores passeando e fazendo compras. Dois homens mais velhos sentavam-se junto ao cais, trocando histórias de pescaria. Vanessa sorriu, lembrando-se do avô, sentado na cadeira de balanço da varanda, esculpindo pequenos animais de madeira para que ela e os irmãos brincassem. Aliás, eram os únicos brinquedos que tinham.
Uma vida simples, mas cheia de amor, pensou, com saudade do avô.
Ela respirou fundo, saboreando a brisa fria que vinha do mar. Como o sol estava alto ainda fazia calor, mas logo chegaria à estação dos furacões, com chuva, umidade e frio intenso. Cruzando os braços para proteger-se, andou mais depressa para a pequena estrada que levava o castelo. Em poucos minutos entrava no calor acolhedor da casa.
Depois de preparar café, esfregou os braços gelados, e ouviu um ruído vindo de fora. Franzindo a testa, foi até a porta de trás e afastou as cortinas que cobriam a pequena janela. Todos os seus impulsos femininos tornaram-se vivos e intensos, ao ver as costas nuas do homem que cortava lenha. Os músculos poderosos moviam-se numa dança da qual não conseguia afastar os olhos.
Efron.
Como era bonito, usando apenas jeans e botas! De onde estava, podia ver apenas o perfil do rosto, com certeza o lado sem cicatrizes, já que os traços eram aristocráticos e bem-feitos. Os cabelos escuros flutuavam ao vento, cobrindo totalmente a nuca.
Os braços eram fortes, musculosos, e ao erguer o machado para cortar mais uma tora, Vanessa pôde ver como eram poderosos, já que a madeira partiu-se em um golpe. Ele deu mais alguns golpes e depois parou, apoiado no cabo do machado. Quando começou a falar, Vanessa percebeu que não estava sozinho e foi até a janela. Outro homem, mais velho, sentava-se num banco e brincava com um canivete. Era Billy Fresh, e aparentemente era bem mais do que um caseiro. Era amigo de Efron. Talvez seu único amigo. Billy conversava animadamente, o rosto moreno e enrugado meio coberto pelo boné.
A camiseta escura ajustava-se ao tórax esguio, e o jeans estava tão gasto nos joelhos que a cor desbotara. Ela observava os dois homens, e como se Efron soubesse que estava ali, continuava de costas. Ainda assim, pôde ver cicatrizes longas e finas descendo pelas costelas, como se tivessem sido feitas por adagas afiadas.
Devia ter sido muito doloroso, e mais uma vez, imaginou como teria sido o acidente. De repente, ele inclinou a cabeça para trás e riu. O som, carregado pelo vento, chegou até Vanessa, que estremeceu, sentindo um estranho calor percorrê-la. Pelo menos ele não tinha perdido a capacidade de desfrutar de pequenos prazeres, como conversar e rir com um amigo, pensou, desejando juntar-se a eles.
Mas, se quisesse que o visse, já teria aparecido.
Ele disse algo que fez Billy corar. Logo se levantava, sorria para Efron e colocava mais toras aos pés dele. Efron continuou a trabalhar, cortando tora por tora, enquanto Billy empilhava os pedaços. Então, o caseiro parou, olhando diretamente para ela.
Vanessa sustentou o olhar.
Efron largou o machado e pegou o casaco com capuz.